Antes de começar a expedição eu já praticava Hatha Yoga. Há 5 anos comecei perceber a diferença no meu comportameto depois das aulas, alguns anos depois, no meu comportamento diário. As práticas de respirações junto com as posturas e a meditação trazem um olhar distinto para o mundo, um olhar essencial de si mesmo, que pode ser simplesmente traduzido em paz.
Quando busquei pela primeira vez fazer yoga queria preencher um vazio no meu peito, vazio que não conseguia entender o que era e nem de onde vinha. Mais tarde acabei ficando frente-a-frente com ele e tive que tomar a importante decisão de enfrentá-lo.
Depois que você encontra uma paixão é muito cruel deixá-la de lado. Então no meio da nossa viagem, quando estávamos em Barcelona e tínhamos que decidir qual seria o próximo destino eu só conseguia pensar na Índia. Em fevereiro de 2014 lá estávamos nós!
Confesso que o choque foi drástico, difícil de se aturar como ser humano. Por diversas vezes queria gritar e voltar para minha casa (se gritasse talvez nem eu escutasse o som da minha voz!). Se você conhece o norte do país deve saber do que estou falando, se não conhece vale a pena a experiência. Na Índia está uma das grandes feridas humanas do mundo. O sofrimento e pobreza têm endereço.
Nas andanças em busca de Yoga e novas experiências encontramos o Shri Kali Ashram, no sul da Índia, em um vilarejo tranquilo cheio de praias maravilhosas chamado Galgibaga. A Índia tem seus contrastes!
Chegamos no Ashram com o objetivo de ficar um mês em imersão praticando yoga e meditação, no fim ficamos 4 meses trabalhamos como voluntários e nos formamos professores de Yoga do sistema Kaula.
Por quê?
A cultura tradicional indiana é maravilhosa e basea-se na felicidade de cada ser, pois acredita que cada ser que habita este planeta é divino em sua essência. E o Yoga tradicional chamado de sistema Kaula busca florescer e alimentar sua essência através do equilíbrio do corpo e da mente. Então, o objetivo passa a ser o florescimento da sua essência como ser. E quando você vive em sua essência é natural ser feliz, simplesmente por aproveitar cada segundo da vida vivendo-a.
Como?
O sistema kaula é uma combinação de posturas (asanas), respirações (pranayamas) e meditação através de uma sequência fixa milenar, no qual cada asana trabalha para o desenvolvimento do asana seguinte construindo a força, movimento e relaxamento necessários para equilibrar sua estrutura física, seus sistemas imunológico, endócrino e circulatório e também os aspectos psicológicos da sua mente.
O Yoga tradicional ayurvedico, assim como a medicina chinesa, acredita que quando você relaxa você permite que sua energia vital (prana) percorra os pontos de energia do seu corpo causando o equilíbrio natural. No sistema Kaula a meditação acontece ao longo de toda a prática, não somente ao final da sequência, o que ensina seu corpo a relaxar em qualquer situação, mesmo que não confortável inicialmente, dentro e fora da aula. Além disso, o Yoga tradicional não é baseado na competição, tanto a competição com os outros quanto a competição com você mesmo, pois quando você está competindo é normal você querer fazer mais do que seu corpo pode naquele momento, causando lesões. O sistema Kaula respeita os limites do seu corpo, pois acredita que cada ser é diferente em estrutura, saúde e experiências de vida, então, cada pessoa passa por um processo diferente para chegar ao equilíbrio.
Depois de viver e aprender tudo isso não dava para ir embora daquele lugar sem querer compartilhar com o resto do mundo esse sistema. Começamos a compartilhar o sistema Kaula como voluntários em Darwin (Nightcliff foreshore) na Austrália, durante 2 meses. No início tínhamos cerca de 5 alunos, e na nossa última aula eram 20 alunos. Para mim essa experiência ligada ao Yoga, mais uma vez, transformou nossa viagem, principalmente, pela sensaçãomaravilhosa de poder compartilhá-lo apenas porque acreditamos nele, de fazer pelo outro sem querer nada em troca e, também, por confirmar que o sistema Kaula é realmente rico para outraspessoas assim como é para mim.
Um dia ainda quando estava no Ashram, na prática da tarde, eu entrei no estado meditativo profundo, mistura de sentimentos e cenas passageiras que não se traduziam em nada, mas era uma viagem interna para algum lugar que eu nunca tinha ido antes, um lugar pouco explorado e com medo de ser encontrado. Depois que voltei, a partir daquele momento eu sabia que eu estava me descobrindo aos poucos, que esse vazio dentro de mim podia ser preenchido, e nos dias seguintes descobri que poderia preenchê-lo com perdão e amor. Sim, somos seres errantes, mas somos divinos e quando aceitamos este fato é impossível não querer amar sem limites, essencialmente, a nós mesmos!